“Alea iacta est”. “A sorte está lançada”.
A frase famosa é de Júlio César, ao atravessar o Rubicão. Ela retrata uma das passagens marcantes do império romano. Mas pode se aplicar também ao momento político que vivemos, com o início da propaganda eleitoral gratuita. A sorte já está lançada. Pouca diferença vai produzir a campanha gratuita por rádio e televisão.
Como era proibido a um chefe militar chegar em Roma com suas tropas, ao atravessar o Rubicão Júlio César já sabia que sua fama de vencedor teria mais peso do que as precauções republicanas do Senado Romano. Ele tinha acabado de conquistar a Gália. Ele confiava na força política desta façanha militar. Sua fama tinha crescido entre o povo, que costumava aclamar os vencedores. Mas tinha suscitado também a oposição do Senado, que não desejava ver seu poder político diminuído com a chegada de um general vitorioso.
Pesava muito mais a façanha já feita, do que os cuidados pela legalidade republicana.
Olhando o panorama eleitoral, constata-se que ele já está propriamente definido, e não sofrerá grandes transformações. As atenções se voltam, quase exclusivamente, à eleição presidencial, onde despontam três candidatos. Algum destaque é dado a raras disputas para o senado. As eleições majoritárias despertam muito mais a atenção dos eleitores. A fascínio pelos vencedores ainda continua, desde os tempos do império romano.
Os milhares de candidatos à Câmara Federal e às assembléias legislativas, estes sim, percebem que sua sorte ainda vai depender de quantos eleitores conseguirão amealhar para suas candidaturas. Mas eles se parecem a um bando de pombas catando os grãos que caem à beira do caminho, depois que a caravana principal já passou.
Esta a situação política que vivemos no Brasil. Ela carrega um peso enorme de fatalidade, que vai repetindo o mesmo panorama, que é decidido por forças alheias á dinâmica propriamente política, que estaria baseada no poder, na liberdade e no discernimento dos eleitores.
Como o poder que Júlio César experimentava por ter conquistado a Gália, existem no Brasil poderes que se fazem valer no tempo das eleições, e que definem muito mais o resultado eleitoral do que a consciência livre dos cidadãos.
Mas isto não tira o valor democrático, e pedagógico, das eleições. Elas continuam sendo o melhor instrumento para estimular e captar a responsabilidade política dos eleitores. Por ocasião das eleições nos damos conta de como o processo político poderia ser modificado, para que expressasse melhor o empenho constante dos cidadãos em constatar necessidades, identificar problemas, e criar consensos para resolvê-los.
Existem desafios políticos muito grandes para pensarmos a administração de um país com tamanho continental como o nosso. Precisaríamos definir com muito mais clareza e convicção o projeto de país que queremos, para implementá-lo através da participação permanente dos cidadãos, e não somente por delegação a representantes do povo, mesmo que esta continue sempre sendo válida e necessária. Mas ela não pode nunca significar uma abdicação do poder popular direto.
Mas para isto é preciso garantir um processo adequado, definido e votado antes que os interesses eleitorais entrem em jogo. E´ por isto que uma reforma política verdadeira só é viável no início de mandato.
O desafio para o próximo governo é promover, logo no seu início, uma verdadeira reforma política, que garanta e estimule a participação do povo na definição dos seus destinos. Uma façanha maior do que aquelas que rendem os votos para os vencedores desta eleição.
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