domingo, 10 de julho de 2011

O GATO MOLHADO


Ina Melo


Para minha neta Priscilla


          O dia amanheceu carregado de nuvens escuras. O sol escondido por trás das montanhas recusava-se a aparecer. Deitada na escuridão do quarto, Lívia não queria acordar para a realidade.
          Sabia que desta vez não haveria retorno. A briga de ontem passara dos limites: de um e do outro. Quantas ofensas! Quantas mágoas! E ela que pensava amar loucamente aquele homem. Que engano! O amor é cruel e os homens mais ainda. Seria preciso usar palavras sórdidas para terminar uma relação vivida de momentos tão bonitos e prazerosos. Eles se encaixavam tão bem quando rolavam na cama fazendo amor ou sexo, agora não sabia qual o mais forte.
          Decidiu levantar-se e tomar um demorado banho. Se tivesse coragem se afogaria na banheira. Assim evitaria o recomeço. Novamente só, ouvindo as cantadas indecentes dos colegas de trabalho, as piadas dos irmãos, tudo igual. Rapidamente trocou de roupa, pegou a sombrinha e saiu para tomar um café no boteco mais próximo.
          Ao abrir a porta assustou-se: Encolhido no batente viu um gato enorme, todo molhado. Coitadinho, pensou! Receosa tentou pegá-lo. Ele não reagiu. Abraçou-o apertando-o junto ao peito. A chuva continuava. Quando desceu a calçada, através das lentes embaçadas dos óculos, viu quatro belos olhos dourados fitando-a com ardor. O coração bateu forte. Nunca mais ficou só.
(Recife/2006.)


Obs: Imagem enviada pela autora.