domingo, 31 de julho de 2011

CORAGEM


Djanira Silva


       Sempre fiz o possível para que meus filhos não tivessem medo de ir ao dentista. Um dos maiores cuidados era eu mesma nunca fazer tratamento dentário com algum deles por perto, pois se vissem o escândalo que faço e o medo que tenho, jamais sentariam numa daquelas cadeiras.
       Costumava conversar com eles afirmando – com toda a falsidade que o meu medo me recomendava – tratar de dentes é uma coisa boa, não dói muito, e só traz benefícios. Assim, consegui convence-los. Até um certo ponto, eu estava com a razão, porque hoje o tratamento é bem mais humanizado. Antigamente, a gente sofria o diabo com a broca pé duro.
       Levei um deles para fazer uma restauração.
       Depois de acomodado na cadeira, comecei a sessão de convencimento.
       - Não tenha medo, meu filho, feche os olhos, relaxe e pense na Pantera-Cor-de-Rosa.
       Ele sentou-se, bem relaxado, conforme eu mandara, olhos fechados, enquanto o dentista ia dizendo: “não puxe minha mão, se sentir qualquer coisa, dê um ligeiro toque que paro na mesma hora”. Ele entregou-se confiante.
       Em certo momento, ele tocou de leve na mão do médico que, de imediato, suspendeu, parou:
       - O que foi, meu filho?
       - Doutor, a pantera está ficando preta.


Obs: Texto retirado do livro da autora – A Maldição do Serviço Doméstico e Outras Maldições.