Marcelo Barros(*)
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(irmarcelobarros@uol.com.br)
Nestes dias, milhares de pessoas de todo o mundo voltam de Dakar, no Senegal, onde na semana passada (de 06 a 10 de fevereiro), se encerrou o 9º Fórum Social Mundial. Desde os anos 70, a cada ano, os homens mais ricos do mundo se reúnem em Davos, na Suiça, para um Fórum Econômico Mundial. Há dez anos, educadores e militantes de direitos humanos tiveram a idéia de promover um encontro diferente. Para mostrar que o dinheiro é importante, mas não é tudo, propuseram um encontro no qual as pessoas se encontrassem como cidadãs do mundo e para pensar a possibilidade de um mundo mais justo e de paz. Os grandes meios de comunicação, ligados aos proprietários do Capital, não aprovaram a idéia e a ridicularizaram de todos os modos que puderam. Os promotores do 1º Fórum Social Mundial, ocorrido em Porto Alegre (2001), pensaram em reunir umas cem pessoas. A surpresa foi que, espontaneamente, sem convites e sem maior estrutura econômica, chegaram mais de três mil. No 2º Fórum, já eram mais de 20.000 e nos fóruns seguintes, várias vezes, o número ultrapassou cem mil. O regulamento do fórum o mantém como espaço aberto à participação de toda a humanidade. Não tem vínculos religiosos, nem político-partidários. Nos fóruns, nenhuma autoridade política é maior do que qualquer outro cidadão. Nele participam índios, comunidades afro-descendentes, lavradores e pessoas sem teto, discutindo de igual para igual com doutores de universidade e políticos profissionais. Desde o 4º Fórum Mundial, ocorrido em Bangladesh na Índia, centenas de dalits, considerados impuros por muitos de seu país, têm o direito de falar e propor outro modo de organizar a sociedade. Em 2009, o fórum aconteceu em Belém e assumiu a preocupação maior da defesa da Amazônia e da solidariedade aos povos indígenas. Neste ano, de 06 a 13 de fevereiro, o Fórum se reuniu pela segunda vez na África, desta vez no Senegal, um dos países mais pobres do continente.
Se comparamos o mundo de 2001, quando ocorreu o primeiro fórum social e a realidade atual, constatamos mudanças imensas e nem sempre para melhor. Ao mesmo tempo que o sistema econômico capitalista vive uma crise estrutural imensa que já dura mais de dois anos, a maior parte dos governos não busca alternativas. Simplesmente investem somas de dinheiro para salvar bancos e concentrar mais ainda as grandes multinacionais, enquanto exigem dos pobres sacrifícios maiores e mais insegurança social. Em países antes equilibrados, as taxas de desemprego sobem às alturas e o número de pobres aumenta assustadoramente. Ao mesmo tempo, além das vítimas asiladas de regimes políticos opressores, agora se multiplicam também as vítimas de catástrofes naturais, cada vez mais freqüentes e descontroladas. Na Austrália, às mais fortes inundações dos últimos anos, se sucederam tufões e tempestades destruidoras. Assim mesmo, diferentemente do Brasil, o poder público organizou o povo e não houve vítimas fatais. Isso não impede que milhares de pessoas estejam desabrigadas e carentes. Os governos do Congo e da Austrália, assim como os governantes brasileiros prometem ajudar as vítimas da natureza, mas não revêem seus programas que continuam a destruir o planeta e provocar tais catástrofes. Para a sociedade dominante, ganhar dinheiro continua o objetivo fundamental, mesmo com métodos que, a médio prazo, incidem contra a própria vida e provocam mais gastos. Afinal, quem vai devolver aos desabrigados do Congo, da Austrália, do Brasil e tantas outras partes do mundo o que estas pessoas perderam, em termos humanos, emocionais e materiais?
O Fórum Social de Dakar retomou estas questões, procurou formas novas de apoiar os movimentos sociais organizados e fortalecer o processo de descolonização de países africanos e latino-americanos. Certamente, o sucesso deste fórum repercutirá em fóruns locais e temáticos que se espalharão pelo mundo todo. Apesar de todas as dificuldades e desafios, como dizia Dom Hélder Câmara: “Há mil razões para acreditar no futuro e apostar no melhor”. Para quem participou de algum dos fóruns sociais, certamente ainda ressoa o refrão da música mais cantada nos fóruns que ocorreram no Brasil: “Aqui, um outro mundo é possível, se a gente quiser!”.
(*) Monge beneditino, teólogo e escritor.