Vladimir Souza Carvalho *
O momento é sério e de convocação geral para a discussão (e solução, evidentemente) de um problema grave, aliás, sumamente grave, ocorrente na cidade, sobretudo nas árvores das ruas e das praças, e também nos telhados, que se mantém a reclamar uma intervenção nossa. Refiro-me, antes que percam a paciência com minhas longas introduções, ao problema ocorrido entre pássaros. Sim, pássaros, ou mais precisamente, reunindo, em seu contexto, as lavandeiras, os pardais e o bem-te-vi.
Pois bem. O problema gira em torno da habitação, e o que o torna pior que simples guerra de três espécies de pássaros – e que ninguém se assombre – desvalorizados. Traduzo o problema: a lavandeira constrói o seu ninho. O pardal vem e dele se apossa, sem nenhum mandado de desocupação, sem nenhuma ordem judicial. Toma o ninho na força. Depois, é a vez do bem-te-vi se apossar do ninho do pardal, fazendo prevalecer, no caso, o seu maior poderio.
Os conflitos, entre eles, se passam a luz do dia, na cidade, aos nossos olhos, sem que ninguém possa aquilatar que tem contribuído para a enorme diminuição do número de lavandeiras, que parece ser a mais atingida e prejudicada. É certo que ninguém ainda não se preocupou com alguma pesquisa acerca da queda da população de lavandeiras, nem tampouco ouviu os pardais se queixarem da nefasta conduta do bem-te-vi. Mas, os entendidos têm, na surdina, chamado a atenção para o fato de o problema continuar existindo, sem que nenhuma providência seja tomada por quem de direito. E autoridade neste país não falta.
E é justamente essa omissão, já de décadas, que me impulsiona a trazer o fato a público, na busca de despertar a população para o problema. Não posso sugerir a criação de conjuntos residenciais com capacidade para atender as três categorias, mediante a aprovação de normas que proíbam qualquer invasão, nem sei como será possível reunir lideranças dos três grupos para a fixação de condutas que permitam uma convivência pacífica entre todos.
O certo é que o Poder Público, nas três esferas, em compasso com os clubes de serviços e de toda a sociedade, deve colocar na ordem do dia a solução de tal problema, antes que as lavandeiras, as mais prejudicadas, por se constituir na menor população, desapareçam por completo, sem esquecer o preito de gratidão que temos para com o pardal, que veio de Portugal há mais de cem anos para ajudar no combate à algum tipo de febre no Rio de Janeiro, e, por fim, antes que o bem-te-vi se torne espécie única, apesar da elegância do seu canto.
Não há mais lugar para omissão. Se as lavandeiras não reclamam, se os pardais silenciam com relação à conduta do bem-te-vi, se há um silêncio geral, não significa que o problema foi sanado. Sinaliza, ao contrário, que o Poder Público, para resolver as contendas, e, todas ligadas à moradia, deve abrir um espaço e agir, com rapidez, sem burocracia, visando acabar as querelas, antes que as lavandeiras desapareçam, antes que os pardais resolvam atacar a raça do bem-te-vi, transformando nossas ruas e praças em campos de batalha. Ainda há tempo de se fazer alguma coisa. É o que espero, na condição de mero observador, me comprometendo a integrar qualquer comissão constituída para tal fim, sem exigir nenhum jetom.
Publicado no Diário de Pernambuco