terça-feira, 30 de novembro de 2010

DECIFRA-ME OU TE DEVORO AS MILHAS

Paulo Rebêlo
(www.rebelo.org)


A cada promoção de passagens aéreas na internet, tenho a certeza de acelerar ao menos dois milímetros da minha calvície.

Um centímetro por ser ingênuo em ainda acreditar nesse recorrente conto do vigário das companhias aéreas brasileiras. E outro pela frustração de ser feito de bobo sem poder fazer absolutamente nada, nem mesmo denunciar.

Poder denunciar, até pode. A denúncia segue para a Anac (Agência Nacional de Aviação Civil), uma entidade cujos termos de atuação, presteza e zelo pelo interesse público se situa mais ou menos entre a Anatel e a Aneel.

Para bom entendedor…

Evidente que centenas de pessoas conseguem comprar passagens durante o período promocional. O problema são as centenas que não conseguem. E aos poucos começam a questionar se não seria um jogo de cartas marcadas.

Aparentemente, as empresas não se importam com os questionamentos e nem com os clientes perdidos.

Via de praxe, no Brasil, credibilidade corporativa é um conceito desconhecido.

Porque você às vezes passa o sábado e o domingo inteiro, inclusive de madrugada ou bem cedo pela manhã e, mesmo assim, não consegue concluir sequer um pagamento nem para visitar o Oiapoque.

Azar o seu, é a lei de mercado, é só não comprar mais.

Ocorre que o seu problema é uma questão muito mais complexa do que a simples falta de respeito com o consumidor. Até porque há bastante tempo esse comportamento virou regra em todo o relacionamento entre companhias aéreas e usuários. E os exemplos são inúmeros.

Quando você entra em um sistema para comprar passagens aéreas ou qualquer outro produto pela internet, você vai passar o número seu cartão de crédito (incluindo vencimento e o código de três números) ou fazer um débito em conta.

Com o servidor deles sobrecarregado ou mediocremente gerenciado, é fácil entrar em pânico quando o sistema inteiro cai exatamente na hora em que a transação está sendo efetuada.

Se o site não aguenta o excesso de demandas, presume-se que algo seja feito quando o problema é detectado. Ocorre exatamente o inverso.

É como se toda a equipe de TI fosse embora na sexta-feira à noite (quando começa a promoção) e só voltasse a trabalhar na segunda-feira de manhã — quando termina a promoção.

Você pergunta às assessorias destas empresas e elas respondem (evidentemente) que não é assim. Então essas pessoas estão gerenciando o quê? Uma quitanda?

Quando o site fica sobrecarregado, não há sequer um aviso para informá-lo que sua transação foi recusada ou encontrou “problemas”. A página cai por inteiro ou exibe mensagens de erros indecifráveis, às vezes exatamente na hora em que seu cartão de crédito está sendo checado.

Para onde vão esses dados? Para o limbo? Ninguém sabe se ficam armazenados, se são apagados ou, pior ainda, se de algum modo são computados por engano.

Por causa de erros assim, ficamos sabendo que o sistema de pagamento ou de checagem é um serviço terceirizado. Ao menos, aparentemente.

Então você está passando seu cartão ou suas informações bancárias para uma empresa que nunca ouviu falar, cujos termos de sigilo e atuação você não faz a menor idéia, para no final ficar parado diante de uma mensagem de erro sobre falha de comunicações em banco de dados ou de inatividade (timeout).

Muita gente consegue, horas e horas depois, comprar uma passagem. Dias depois, descobrem que não compraram de verdade. Apenas acharam que compraram. Ou seja, seus dados não foram apagados e nem trocados. Foram realmente computados. Por engano.

O valor é estornado para sua conta sem nenhum aviso. E a reserva nem existe. Às vezes, você só descobre depois de quarenta minutos de espera na central de atendimento telefônico, com a mala pronta.

No caso da TAM, em específico, descubro recentemente que o atendimento pela central sequer lhe fornece um número de protocolo do atendimento. Sem o número, é ainda mais difícil formalizar uma denúncia ou, se você acreditar em milagres, conseguir resolver o problema das reservas inexistentes juntos a um supervisor.

Aliás, uma dúvida que sempre tive. Em empresas como GOL, TAM, Oi-Telemar, Telefônica e tantas outras belezinhas, será que existe supervisor que não tenha apenas decorado uma tabela do Excel de perguntas e respostas?

Talvez exista. Quem encontrar, ganha um doce e uma passagem na promoção.

Obs:Texto escrito em 15.03.2010