quarta-feira, 5 de maio de 2010
TRÁGICOS RESULTADOS DA FALTA DE CONSCIÊNCIA POLÍTICA
Maria Lioza de Araújo Correia
lioza@uol.com.br
Passados os momentos mais trágicos dos desabamentos ocorridos a partir de Angra dos Reis, depois em Niteroi e em outras capitais do Brasil, resta-nos contabilizar nesse terrível balanço, o saldo negativo de vidas humanas, o cenário de dores e angústia pelas perdas de entes queridos e a tristeza imensa por essas mortes previsíveis mas não prevenidas por quem tinha o dever e a obrigação de fazê-lo.
Sabemos que todas as grandes cidades brasileiras, especialmente as capitais, têm grande parte de sua população vivendo em áreas de risco, num convívio aceito tranquilamente, sem contestação pela sociedade, como se fosse uma coisa normal e até louvável, a ponto de inspirar compositores e artistas para cantarem em prosa e versos a beleza de tais amontoados irregulares de barracos, usados por milhares de pessoas como habitação, há várias décadas, passando de geração em geração.
Despiciendo dizer-se que ali nos barracos "pendurados do morro", moram os pobres, os que não tem condição financeira para morar no chão firme e cujo discernimento, obnubilado pela necessidade e agravado pela miséria, leva essas pessoas a contarem com a sorte, arriscando-se a viver nessas áreas vulneráveis a todas as intempéries.
A catástrofe que as atingiu e as mortes que ceifaram vidas preciosas foram inesperadas para as vítimas, mas, não para as autoridades políticas, administrativas, sanitárias, de segurança e demais responsáveis por autorizar ou ignorar a proliferação e construção de barracos em morros, em margens de rios e de rodovias.
O fato é que o problema da moradia para pobre nunca foi prioridade nos projetos dos anteriores governantes, quer da esfera municipal, estadual ou federal, a exemplo do ex-prefeito do Rio de Janeiro, que para ocultar os problemas sociais crônicos existentes nas favelas daquela cidade, sugeriu como solução, construir um grande muro separando uma favela da outra, como na Faixa de Gaza, em que o governo de Israel construiu uma grande muralha segregacionista, para evitar que as revoltas dos palestinos contra as invasões do exíguo território que lhes é reservado, atingissem o território dos invasores israelenses. Essa, também, foi a brilhante solução sugerida pela ex-autoridade municipal do Rio de Janeiro.
E não fica por aí, o descaso dos políticos para com a população. Recentemente, por ocasião da partilha dos royalties do pré-sal, outra autoridade, dessa vez estadual, expressou sua indignação pela participação de todos os estados da federação nos recursos do pré-sal, considerando a inclusão injusta e prejudicial aos interesses do seu estado, o Rio de Janeiro. Daí, sem o menor pudor ou constrangimento, declarou que o percentual referente aos royalties não daria para bancar a Copa do Mundo e as Olímpiadas a serem realizadas no Rio de Janeiro em 2014 e 2016. Causou espécie o inusitado da declaração, porquanto, era de se esperar que a lamentação do governador fosse em relação a não poder urbanizar as favelas, dotando-as de melhores condições de vida e salubridade, de mais escolas e postos de saúde pública, de aumento dos meios de transporte e de lazer, de mais segurança e tranquilidade para as populações ali residentes e não o chororô patético de um governador temendo ver frustrados seus sonhos pessoais de prestígio e honrarias, como hospedeiro daqueles dois eventos mundiais. É lamentável e decepcionante constatar-se que eventos passageiros, ainda que importantes para o Rio de Janeiro e até mesmo para o Brasil, sejam prioritários, em detrimento das necessidades vitais e permanentes de milhares de pessoas que se encontram sem perspectiva de uma vida melhor, por incúria e omissão de quem tem o dever e obrigação de proporcionar-lhes o mínimo de dignidade e cidadania.
Os mencionados acontecimentos e outros tantos, igualmente nefastos, a exemplo dos frequentes alagamentos de bairros da cidade e das periferias de São Paulo, que durante semanas seguidas, inundam ruas, casas, escolas , etc., fazem emergir uma questão subjacente, fundamental e comum à grande maioria dos políticos brasileiros, qual seja, a falta de consciência política, presente na origem dos descalabros que o país, perplexo e revoltado presencia.
Um dos aspectos flagrantes da falta de consciência política é o que se revela na irresponsabilidade com o dinheiro público, gerando a corrupção desenfreada em todos os níveis e escalões da administração pública. Destarte, essa chaga nacional afeta desde senadores, deputados, vereadores, serventuários simples e graduados, até governadores. Haja vista o vergonhoso espetáculo presenciado ao vivo e a cores por todos os brasileiros, tendo como protagonistas um governador e políticos de sua equipe administrativa. Ademais, a corrupção não se limita ao Congresso Nacional. Ela se espraia e atinge, também, o Poder Judiciário, contaminando juízes e desembargadores, que a rigor deveriam ter conduta ilibada, porquanto representam a última instância para o cidadão carante de direito e de justiça.
Com relação aos políticos, a ausência de consciência política que os caracteriza, é devida em parte ao fato de que a grande maioria ingressa na política visando, principalmente, compensação financeira, prestígio, privilégios, ou seja, para "se dar bem", como se usa dizer na linguagem popular. Alcançado o poder, acomodam-se na sua insignificância, pois não demonstram capacidade sequer para elaborar algum projeto de interesse dos seus eleitores. Assim, relegados ao anonimato parlamentar, só servem como massa de manobra dos líderes, quando estes necessitam de quorum para aprovar matérias postas em votação nas câmaras estaduais ou no Congresso Nacional. Tal segmento político amorfo, porém moldável aos interesses imediatos nem sempre coincidentes com os interesse nacionais, é conhecido como o "baixo clero", sinônimo de despreparo político e de nenhuma consciência da missão que lhes foi outorgada pelo voto dos eleitores.
Nesse cenário de inconsciência, descompromisso e corrupção, como pretender que tais políticos ponham em votação e muito menos aprovem o projeto "FICHA LIMPA"? Será que eles estão dispostos a dar um tiro em seus próprios pés? Tudo indica que não. Nesse caso, os eleitores brasileiros é que deverão promover a grande mobilização popular visando impossibilitar os políticos corruptos de serem votados e eleitos nas próximas eleições, independentemente da não aprovação do referido projeto. A propósito, mister se faz admitirmos que temos os políticos que merecemos. Nós é que os elegemos sem levar em conta a conduta pessoal e as posições políticas dos candidatos que nos representam nas Câmaras e no Senado. Portanto, se não temos critério em nossa escolha, não podemos exigir critério por parte de quem escolhemos.
Contudo, diante dessa desalentadora realidade, ainda podemos vislumbrar alguma luz no fim do túnel, pois as mudanças e transformações não acontecem por milagre, mas dependem da nossa participação na luta para construirmos o país que desejamos. Nesse sentido, é salutar nos despojarmos de preconceito e admitir os avanços econômicos e sociais, realizados pelo atual governo do Brasil, cujos argumentos em contrário desmoronam diante dos fatos reais, para continuarmos priorizando o modelo concreto e positivo que deu certo. Mas, é claro, que o engajamento na luta pela continuidade desse processo vai depender de nossa conscientização política.
Obs: Imagem postada no Informativo de maio do blog.
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