segunda-feira, 29 de março de 2010

UM ESTRANHO PARA AMAR



Dade Amorim
dedaamorimo@gmail.com


O tema é delicado. Envolve um tipo de relação humana muito rica e difícil, em que um ou dois adultos resolvem assumir como filho alguém cujos pais não quiseram ou não puderam criar. Mas é também importante e necessário, já que pode ser a oportunidade de resgatar o que se considera o fator maior para o equilíbrio psíquico e afetivo de uma criança: conviver e sentir a segurança de uma família estável.

Não vou falar do ato legal e burocrático, quase sempre cego e surdo ao coração; é um ato necessário, mas dependente do tipo de racionalidade de quem interpreta os fatos e lida com o texto da lei. Também não se deve esquecer que há manipulações nesse ato, e que o próprio pretendente à paternidade/maternidade pode esconder interesses bem distantes – e até contrários – daqueles do menor que está reivindicando.

Mas a adoção consciente, feita por pessoas que querem dar um destino digno a seus próprios sentimentos e transformar alguém em um filho, é um dos atos humanos mais próximos da idéia de Deus que temos em nós. Nada e ninguém obrigam a isso, e no entanto há quem assuma esse compromisso para toda a vida, diferente de todos os outros; um compromisso mais pesado e mais doce que um casamento, de resultado incerto. Mesmo assim, quem não desanimou e persistiu até conseguir realizar o que desejava, e enfrenta tantas dificuldades até abrir o espaço necessário para que o pequeno estranho seja transformado em filho pelo amor e pelo desejo, só pode ser gente boa, dessa que salva e redime o resto da humanidade.

Ninguém é obrigado a isso, no entanto. Há quem prefira gerar embriões que serão congelados e na melhor das hipóteses prover a medicina de células-tronco. Um destino útil, sem dúvida, mas não a vida do jeito que a conhecemos e experimentamos, do jeito que a desejamos para alguém que se ama como filho. Há outras fontes de células-tronco, que agora a ciência já consegue até duplicar artificialmente.

Acredito que todos temos em nós essa potencialidade de ser pai ou mãe. Se por algum motivo ela não se concretiza num filho biológico, e diante de tantas crianças órfãs, abandonadas e maltratadas pelos pais e/ou pelos estranhos que lidam com elas, é quase instintivo que se procure aproveitar esse espaço para tirar um ou mais desses menores do estado de abandono, dar a eles um futuro digno e uma chance de felicidade.

Obs: Imagem enviada pela autora.