terça-feira, 23 de março de 2010

PACIÊNCIA FRANCISCANA



Djanira Silva
djaniras@globo.com
http://blogdjanirasilva.blogspot.com/


O frade inspecionava os serviços de pintura que estavam sendo executados na sacristia do convento. O sujeito que fazia o trabalho era um misto de pintor, pedreiro, caiador, canto.
Empoleirado no alto da escada, acompanhava cada pincelada com uma cantiguinha altamente profana aos ouvidos do sisudo frade: “Chiquita bacana, lá da Martinica...........se veste com uma casca de banana naniiiiica....
As palavras escandalosas ecoavam pelas paredes do Convento. O velho franciscano arrepiou-se todo, muniu-se de toda a santidade de que era capaz e partiu para a reclamação:
- Ei, mocinho, vê se canta alguma coisa mais de acordo com o ambiente.
O pedreiro olhou lá de cima, com um olho só que lhe restara de uma briga, e obedeceu sem reclamar:
“-Quereemoos Deus, hoommennss ingraatoos...”
Como fizera com a outra cantiga cujos movimentos eram rápidos e animados, acompanhava agora o hino sacro, vagarosamente seguidos pelos movimentos também vagarosos, do pincel.
O frade que já ia se retirando voltou. Munido de calma e paciência constatou que naquele embalo, o serviço iria render o resto do ano.
Logo mudou de opinião:
- Rapaz, pode cantar a sua musiquinha, é mais animada.

Obs: Texto retirado do livro da autora - A Maldição do Serviço Doméstico e outras Maldições -