Marcelo Barros(*)
No mundo inteiro, o ano novo é saudado por uma noite de muitas luzes, fogos e festejos comunitários. Em alguns países, as pessoas costumam comer ostras, para que o ano seja aberto como se pode abrir um marisco saboroso. Comunidades tradicionais costumam queimar roupas usadas no ano velho ano para se revestir do novo no corpo e no seu interior. Em regiões tropicais, as pessoas banham-se no mar ou em rios para receber das águas a renovação para esse tempo novo. Todos esses ritos são sugestivos, mas não podem magicamente mudar o rumo das coisas, se nós mesmos não nos renovarmos e não mudarmos o que em nós está envelhecido ou superado. A numeração dos anos depende de nossos critérios. O que diferencia este 31 de dezembro de um 13 de agosto qualquer é principalmente a possibilidade de aproveitar a mudança de estações para nos renovar e acolher a renovação de vida que se oferece a cada um de nós pessoalmente e à sociedade como um todo.
Para ter clareza do que em nós e no mundo deve ser novo, é preciso fazer uma avaliação do ano que passou. Algumas tradições espirituais guardaram ritos de “entrega do ano que passou”. O mercado faz anualmente um balanço das empresas. Grupos de estudo falam em revisão de vida. No plano internacional, 2011 consolidou a crise internacional, aprofundou as dificuldades econômicas e revelou mais do que nunca uma crise civilizatória e ecológica. A conferência de Durban sobre as mudanças climáticas se concluiu sem perspectivas que prometam nada de realmente novo ou melhor. Pouco antes dos ponteiros marcarem o final do ano, o presidente dos Estados Unidos anunciou a retirada oficial de suas tropas do Iraque, deixando aquele país destruído e o seu povo mais dividido, além de chorando a morte de mais de cem mil pessoas, entre as quais muitos civis, crianças e idosos, vítimas da invasão norte-americana. Por outro lado, no mundo inteiro, milhões de cidadãos, principalmente jovens, foram às ruas para protestar contra essa forma de organizar o mundo e principalmente para deixar claro: a economia deve servir à humanidade e não as pessoas serem escravas das finanças. Na América Latina, a recente criação da CELAC (comunidade das nações latino-americanas e caribenhas) representa sim uma esperança nova de integração continental. Nessa conjuntura, cada um de nós se dá conta mais do que nunca: nos parecemos com cristais belos e luminosos, mas muito frágeis. Como diz São Paulo, carregamos dentro de nós um tesouro e ele não é apenas para nós mesmos para ser sempre compartilhado. A poetisa Emily Dickinson esceveu: “O Amor é a pessoa que se deixa mover pela energia da Ressurreição. Ela recolhe em si e no mundo a poeira antiga e canta a Vida que está brotando.”
(*) Monge beneditino, teólogo e escritor.