Vladimir Souza Carvalho *
A lição, ouvi do professor Alfredo Alves de Oliveira, ou simplesmente, professor Oliveira, como a gente, de Itabaiana, daqueles tempos, o tratava. Fazíamos, em sua casa, à rua da Vitória velha, os preparatórios para as provas visando ao ingresso no curso ginasial. Éramos poucos, cinco ou seis, cabendo todos em uma das salas de sua casa. O professor Oliveira fornecia um exemplo da vaidade. Cita o peru, ao levantar as asas, num ato de exibicionismo. Mas, ao olhar para os pés, o peru declina, fazendo as asas voltarem ao normal.
Pois sim. O canal, que despeja e recebe águas no/do Rio Sergipe, lindeiro à Av. Francisco Porto, é o pé do peru do Calçadão da Treze de Julho. O manguezal, suntuosamente verde, bonito de perto, tão bem fincado que não permite o caminhante vislumbrar o outro lado, separa o Calçadão das águas do rio. A esta paisagem se inclui as amendoeiras, teimosamente erguidas e a se erguer, buscando um espaço no meio do manguezal, e a outras árvores aqui não nominadas. Ao conjunto se daria o nome de asas do peru, cuja beleza, em só olhar para o antigo riacho, hoje canal, já referido, se desmancha ante o lixo que ali se acumula, de garrafas de plástico, de paus, e de outras espécimes, que ali ficam enfiadas na lama, bem no pé da balaustrada da ponte.
Esse mesmo lixo, às margens do Rio Sergipe, já vi em processo criminal tendo por acusação a destruição de parte da vegetação de certa área, um pouco adiante, em direção a ponte sobre o Rio Poxim. O feito, recordo bem, trazia fotos de centenas de garrafas de plástico, ao lado de pedaços de casco de coco, que, - ninguém ria, pois falo sério, - dava a foto uma conotação até artística, por ser factível da sujeira se extrair alguma beleza. As rosas também nascem no pântano, dirá o poeta. Em suma, o lixo está lá plantado e acomodado, preso a lama, extraordináriamente visível aos olhos de todos que usam o Calçadão da Treze de Julho para as caminhadas diárias, em qualquer horário.
Fosse instituído um concurso de rio, beirando a capital, mais sujo do país, não tenho dúvida que o Rio Sergipe seria o premiado, ou melhor dizendo, que Aracaju receberia o primeiro lugar, porque não é de hoje que as margens do Rio Sergipe, no que se refere à área limítrofe com o Calçadão aludido, o ostenta e exibe, a deixar bem assentado que, apesar de mais de cem e cinquenta anos de Capital, ainda não descobrimos a quem é reservada a tarefa de limpar as margens do Rio Sergipe, e, logo na área urbana mais valorizada da urbe aracajuana. O certo é que os canais, pelo menos aqueles que se situam nos meus trajetos, se confundem tanto com o lixo que daqui a algum tempo haverão de suscitar a dúvida, no sentido de se elucidar se é o canal que invadiu o lixo ou se é o lixo que tomou conta do canal.
Se o lixo, genericamente, sozinho, já se torna uma bomba que, apesar de não ser atômica, explodirá a qualquer momento, nesta ou nas décadas seguintes, se nenhuma providência adequada for tomada, ninguém tenha a menor dúvida, quando se faz acompanhar da água – elemento vital para o prosseguimento da vida do planeta -, o risco se torna maior, porque não mais se faz solitário. Agora arrasta a água, proporcionando ao bom caçador, traduza-se, ao administrador, matar dois coelhos de um só disparo.
De qualquer forma, ainda é tempo de limpar as margens do Rio Sergipe, a fim de ajustá-las a beleza do Calçadão da Treze de Julho. Como está, no momento, ou seja, com o lixo acumulado nas suas margens, é como se deparássemos com uma pessoa, impecavelmente trajada, despojada de sapatos, com os pés eminentemente sujos e fedorentos. Paciência. Não combina.
Publicado no Correio de Sergipe