Padre Beto
Um homem sábio morava perto de uma pequena cidade. Todos admiravam sua inteligência, seu bom senso e muitas lendas surgiam em torno de sua pessoa. Uma destas era que toda a manhã, ao fazer sua oração, o sábio era elevado aos céus. As pessoas costumavam dizer que, graças a esta capacidade de fantástica transcendência, ele adquiria a sabedoria necessária para aconselhar os pobres mortais. Um jovem, ao ouvir pela primeira vez a absurda história, resolveu provar a todos da pequena cidade que esta não passava de uma lenda sem sentido. Em um certo dia, o jovem levantou de madrugada e se escondeu perto da cabana do sábio. As oito da manhã o sábio abriu a porta da casa e com uma sacola caminhou em direção à floresta. O jovem o seguiu sem se deixar perceber. O sábio chegou, então, ao prostíbulo da região. Com grande curiosidade, o jovem aproximou-se da casa, espiou pela janela e viu o sábio colocando sobre a mesa frutas, pães e presunto. Lentamente, o jovem deixou o sábio tomando seu café da manhã com as prostitutas e retornou para sua pequena cidade. Os amigos ao encontrá-lo perguntaram se ele havia visto o velho subindo aos céus. Ainda pensativo, o jovem respondeu: “Ele sobe muito mais alto do que os céus. Podem ter certeza!”
Pertence à natureza humana a busca inconsciente de prazer duradouro, de permanente felicidade. “Todo prazer anseia por eternidade”, escreveu certa vez Nietzsche. Porém, os momentos de prazer que podemos ter em nossa existência são carentes de durabilidade. Por mais que todo ser humano anseie por uma vida prazerosa, parece ser ilusória a tentativa de uma sensação de felicidade constante. Com certeza, o caminho mais superficial e menos inteligente para se manter o prazer de viver é o hedonista. Justamente, a alternativa hedonista é a mais estimulada por nossa sociedade de consumo. O ser humano busca a felicidade por um caminho hedonista quando procura maximizar a soma de episódios de prazer em sua vida. O objetivo é o aumento constante de boa comida, boa bebida, de sensações e emoções, enfim, a intensificação das experiências sensitivas. O hedonismo também se manifesta na busca constante de alcançar objetivos individuais. O ser humano não procura viver o prazer no aqui e agora , mas sacrifica parte de seu tempo e energia, para alcançar objetivos como saúde, dinheiro, fama, reconhecimento, poder. O problema destas duas alternativas hedonistas para a felicidade é o alimento constante da ambição individualista. Esta, além de ser um “saco sem fundo”, conduz o ser humano a uma verdadeira experiência de solidão. Sem dúvida alguma, para o sistema capitalista a busca de episódios de prazer ou da realização de objetivos individualistas geram consumo. Porém, a mentalidade hedonista nos leva a uma incansável busca de algo mais e o ser humano nunca alcança a satisfação. Pior que isso, a mentalidade hedonista faz com que o ser humano centre a razão de toda a sua busca em seu próprio ego. Assim, a necessidade de saúde, dinheiro, fama, reconhecimento, poder é insaciável e possui como objetivo uma única pessoa. Esta busca do prazer individual encontra em sua prática uma grande contradição. Enquanto o ser humano alimentar simplesmente seu amor próprio, a satisfação sempre será demasiadamente efêmera e a necessidade de algo mais contribui para uma sensação frustrante diante da realidade. Neste sentido, podemos compreender a provocante frase de Jesus Cristo: “Quem procurar ganhar sua vida, vai perdê-la, e quem a perder vai conservá la” (Lc 17, 33). Jesus não está de forma alguma pregando anulação da personalidade e muito menos submissão, mas apresentando uma fantástica dialética da existência.
O prazer de viver se torna duradouro não através de um caminho hedonista, mas através de uma mentalidade humanista. Esta se inicia com uma busca consciente de realização pessoal, ou seja, com a estimulação e desenvolvimento de todos os nossos dons pessoais. O prazer não se reduz ao simples consumo, mas à satisfação de aprender ampliando seus horizontes e a possibilidade de realizações. A felicidade é alcançada na sensação de se construir uma vida digna, uma personalidade nobre e uma história criativa. Este crescimento pessoal caminha em direção do verdadeiramente tornar-se uma boa pessoa. Esta mentalidade humanista se completa com a busca do bem estar de nossos semelhantes. Estar disposto a contribuir para a vida de outros significa o engajamento positivo nas amizades, na família, na educação das novas gerações, na cultura de nosso grupo, na economia de nossa sociedade, realização da justiça e na política. Para se ter a satisfação duradoura de contribuir para a beleza do mundo, é necessário que nosso engajamento pelo bem comum seja verdadeiramente sincero. Facilmente o ser humano pode ser levado a se engajar por motivos individualistas (fama, reconhecimento, dinheiro, poder etc.), o que torna o caminho humanista de prazer uma forma mascarada de hedonismo. “Minha alma não consegue encontrar uma escada para o céu que não seja através da beleza do mundo” (Michelangelo).