segunda-feira, 26 de setembro de 2011

AS CONVULSÕES NO MUNDO E O AMANHÃ



por
J. A. Horta da Silva
Ex-Director do INETI (Coimbra)
(horta.silva@sapo.pt




O espaço que marca as modificações irreversíveis entre gerações é usualmente ocupado por episódios que rasgam, de modo indelével, o tecido social e, não raramente, a própria situação política, acontecimentos que o tempo costuma guardar sob a designação de factos históricos. No entanto, as sociedades também podem evoluir de modo lânguido e pacífico, como resultado da acomodação e aprendizagem a novas formas de estar e gerir, evolução que passa de geração em geração ao arrepio de convulsões, acontecimentos que a história descarta para terrenos da sociologia.

O mundo actual está a mudar mais depressa do que seria espectável, muito embora ainda não tenha atingido o ponto de rotura. Gradualmente, uma nova ordem aguarda o momento de entrar, enquanto as transformações sócio-políticas aparecem e desaparecem por entre as franjas dos tecidos das sociedades e as guerras são atiradas para guetos da África, Médio Oriente, Ásia e América Latina, tendo por objectivo, o controle do poder sobre matérias primas estratégicas e, segundo dizem, para combater o narcotráfico. Só que esta estratégia não tem tido o sucesso esperado, não obstante os elevados custos inerentes a aspectos de logística e de acções militares, efectuadas não só pelos Estados Unidos mas também por países da União Europeia, todos eles preocupados com o problema das enormes dívidas soberanas. E como se isto não bastasse, sucedem-se motins em vários países da U E, sendo de destacar os que ocorreram recentemente no Reino Unido, na Alemanha e até em Espanha no decurso da visita do Papa, sem esquecer os inimagináveis atentados e assassinatos ocorridos na Noruega, motins e ignomínia que destemperam a vida e tingem o Velho Mundo de preocupação, centrada na procura das verdadeiras razões e correspondentes soluções.

Enquanto estas desordens se propagam, as economias emergentes do Brasil, da Rússia, da Índia e da China prosseguem a sua lenta e sólida caminhada em relação a um futuro mais promissor do que o presente, apostados que estão em manter-se cada vez mais afastados do rumo em que a União Europeia e os Estados Unidos da América estão envolvidos. Há algum tempo atrás, escrevi sobre o BRIC, acrónimo criado pelo Banco Goldman Sachs para designar o conjunto de países com economias emergentes, tendo, ao tempo, lançado mão da fábula relativa à corrida entre a lebre e a tartaruga, na suposição de que a lebre acabaria por acordar a tempo de ganhar a competição. As oportunidades desperdiçadas pela UE e pelos EUA começam a afigurar-se evidentes, à medida que se desenha o resultado da corrida. Para o futuro, perdura um olhar vago com lampejos de rebates de consciência relativos a pecados velhos e recentes cometidos, eventualmente, à revelia de compromissos assumidos e não cumpridos.

Não raramente, a aparência da prosperidade esconde sintomas de adversidade que se colam aos passos da vida de uma forma persistente e dolorosa. Face ao exposto, é preciso meditar sobre a contingência quer da abundância, quer do bem-estar, quando impressos no pó dos caminhos do futuro.