segunda-feira, 2 de maio de 2011

FATORES NEGATIVOS PARA A VIDA DA “SACROSANCTUM CONCILIUM”


Maria Lioza de Araújo Correia
lioza.correia@gmail.com


Lamentavelmente, após a grande enxurrada de movimentos que surgem frequentemente na Igreja Católica, constata-se, até com preocupação, o esvaziamento das celebrações eucarísticas em que é observada a liturgia em sua forma autêntica, isto é, que segue os ditames da Sacrosanctum Concilium, especialmente com relação à musica e ao canto litúrgico. Ao contrário, são preferidas as missas dos padres cantores, em que se privilegia o canto emocional, individualista, intimista e apelativo, sem os critérios balisadores do verdadeiro canto litúrgico. Nessas celebrações o que se vê são verdadeiras hordas de louvadores extasiados, assim formados através das grandes mídias católicas, que não estão preocupadas em preservar das distorções anti-litúrgicas o sagrado rito eucarístico, mas, preocupam-se, principalmente, em priorizar como objetivo maior, o aumento quantitativo de adeptos e de grande audiência televisiva. Diante de tal subversão, não seria o caso, de se indagar se não há por trás de tudo isso, algum imperioso motivo estimulando tamanha alienação que transforma a celebração eucarística do Mistério Pascal de Jesus Cristo em palco de diversão religiosa para multidões? Embora a resposta não seja explicitada, está claramente implícita no benefício financeiro auferido por meio desse estímulo aos movimentos que atraem as multidões, sob a pretensão de evangelização.

Importa ressaltar que a pseudo evangelização, pretendida por padres que incentivam a alienação religiosa das multidões e até por bispos que se omitem, diante dos excessos e extravagâncias praticadas nas tais missas, cujas recomendações litúrgicas para a celebração da Mistério Pascal de Cristo não são observadas, em nada edifica a Igreja. São antes um desserviço à verdadeira evangelização a nós transmitida pelos apóstolos e discípulos, posto que, fundamentada nos ensinamentos de Jesus, os quais interpelam e despertam nossa consciência para a ação evangelizadora. Portanto, o compromisso com o Evangelho de Jesus, que acontece através da conscientização e conduz ao amadurecimento da fé é um processo, que certamente, não se desenvolve por meio de exacerbação das emoções, mas, seguramente, acontece nas consciências despertadas pela Palavra e amadurecidas no seguimento do Evangelho.

Não obstante a influência devastadora das mídias católicas e dos movimentos neopentecostais surgidos na Igreja, todavia, mister se faz reconhecer que, de fato, verificam-se alguns motivos que podem ser atribuídos como causadores do esvaziamento das igrejas, quais sejam: missas mal organizadas, mal cantadas, barulhentas, cheias de improvisações e espiritualmente vazias, que não suscitam nas assembléias a presença do Mistério Pascal de Cristo. Nesse sentido, o próprio Bento XVI, confirmando a importância da verdadeira e autêntica liturgia renovada pelo Concílio Vaticano II, enfatizou que “a melhor catequese é uma missa bem celebrada”.

Também, a respeito das “missas alegres”, importa esclarecer que, não existe nos livros e manuais litúrgicos qualquer recomendação nesse sentido. Existem sim, orientações para que a missa seja bem preparada, bem celebrada e para que “os ritos resplandeçam de nobre simplicidade” (SC 34), a fim de que suscitem a participação efetiva da assembléia que é a destinatária principal da celebração eucarística e que não deve ser levada a confundir a celebração do Mistério Pascal de Cristo com uma diversão religiosa, porquanto, é pela liturgia que ”a obra da nossa redenção se realiza”, especialmente pelo divino sacrifício da Eucaristia. (SC/MR). E ainda, a liturgia “é um sinal das disposições providenciais de Deus. É uma passagem do seu Espírito pela Igreja”. (SC 23).

Por tudo isso, é forçoso reconhecer que os ministros hierárquicos da Igreja têm uma grande responsabilidade e um enorme desafio em sua missão de reconduzir a Igreja que lhe foi confiada, às suas raízes verdadeiras, plantadas por Jesus Cristo e espalhadas pelos apóstolos, a qual, guiada pelo Espírito Santo, foi abençoada com o Concílio Vaticano II, através do qual o sopro benéfico e renovador do Espírito veio reformar a Igreja, restaurar e estimular a Liturgia, "em que a obra de nossa redenção se realiza" (MR), especialmente pelo divino sacrifício da eucaristia, contribui decisivamente para que os fiéis expressem em sua vida e manifestem aos outros o mistério de Cristo e a natureza genuína da verdadeira Igreja". (Proênio SC).

Agora que a Sacrosanctum Concilium está prestes a completar cinquenta anos de existência, estando em pleno vigor, apesar da incompreensão e rejeição que alguns obtusos integrantes do clero lhe dedicam, seria oportuno que os bispos, padres e leigos se debruçassem sobre seus inspirados e sábios ensinamentos para reformarem seus corações e mentes à obediência devida ao Concílio Vaticano II, que é a suprema instância da Igreja. Certamente, guiados pelo mesmo Espírito que inspirou a realização desse importante Concílio, conseguiriam enxergar o valor e a riqueza espiritual que emana de suas diretrizes, as quais viriam contribuir para a realização da missão precípua que lhes foi destinada, qual seja, a verdadeira evangelização pela Palavra e pela Eucaristia bem celebrada. Eis o grande desafio para a Igreja pós conciliar. Se ela vai realizá-lo, só o tempo dirá.