domingo, 15 de maio de 2011

DESPERTAR DA CONSCIÊNCIA


Padre Beto
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Certa vez, um camponês entrou em um restaurante à beira da estrada para almoçar. À mesa ao lado estavam alguns jovens da cidade. Quando o almoço foi servido, o sitiante fechou por alguns minutos os olhos e juntou as mãos fazendo uma pequena oração. Os jovens começaram a debochar da atitude do sitiante e um deles resolveu provocar o camponês: "Na sua casa todos fazem assim? Provavelmente todos vocês rezam para tudo, não é?" O sitiante, que neste meio de tempo já saboreava seu almoço, com muita calma e serenidade, respondeu ao jovem de sorriso cínico: "Não, nem todos em casa rezam para tudo..." O jovem resolveu continuar a conversa perguntando: "Não? Quem não tem o costume de rezar?" "Bem...", respondeu com um sorriso o sitiante, "por exemplo, meu burro, minha vaca e meu porco. Estes começam a comer sem fazer uma única oração!"

Ao contrário do que muitos podem pensar, tornar-se religioso significa vivenciar essencialmente uma rebelião. Aquele que toma consciência de Deus e com Ele inicia um relacionamento qualitativo transforma-se automaticamente em um rebelde. Rebeldia no sentido de não conseguir mais se conformar com o estado das coisas. Religião consiste em uma "não-conformidade" e, portanto, a necessidade de transcendência. O ser humano se torna verdadeiramente religioso quando sente um desejo crescente de vivenciar uma mudança radical em sua vida, mudança esta que o leve à essência de sua existência, de seu viver. Neste sentido, ser religioso não significa a simples conformidade com regras e preceitos de uma determinada religião oficial ou o ato de pertencer uma igreja como se pertence a uma organização ou sociedade. Pertencer a uma igreja e seguir seus preceitos é muito fácil e muitas vezes o fazemos por medo ou busca de segurança, o que na verdade expressa uma postura anti-religiosa. Apesar de provocar obrigatoriamente uma mudança externa, o tornar-se religioso desenvolve-se no nível da consciência entre Deus e o ser humano.

A religião deve, também, nos conduzir a uma verdadeira liberdade. Ela não pode ser um tóxico, pois sua função é a possibilidade da consciência e não da inconsciência. A consciência, por sua vez, é naturalmente rebelde, pois nela inclui o pensamento, a criticidade, o raciocínio, a franqueza, em outras palavras, a individualidade. Uma verdadeira religião deve nos levar à coragem de sermos autênticos. Ser religioso, não é imitar alguém, mas buscar ser você mesmo. Depois de nossa existência, Deus não irá nos perguntar se fomos iguais a Moisés, Jesus, Buda ou Maomé, mas sim se fomos capazes de sermos nós mesmos, se fomos capazes de amar a vida e nossos semelhantes de acordo com nossa maneira de ser.

A verdadeira religião não é algo mecânico, algo que fazemos porque esperam que se faça. Se alguém segue as regras de uma religião para conviver com sua sociedade ou porque foi condicionado a isso, ele poderá ir regularmente à igreja, fazer suas orações, seguir os rituais, mas tudo será vazio e praticamente nada se transformará em sua vida. Se a vivência religiosa não estiver em seu coração, tudo será morto e mecânico. Fazer exatamente como está escrito, sem nenhum erro, pode estar perfeito, mas estará morto. Religião é algo que acontece entre você e sua existência concreta. Não é um mecanismo de convivência social e muito menos tradição, pois religião não pode ser emprestada. O ser humano deve conquistá-la, terá que se arriscar. A religião não pode ser barata ou falsificada. Ela não é consolo, é um desafio. Deus desafia o homem a um crescimento. A religião deve agitar o ser humano e não fazer com que ele se acomode; ela deve transformá-lo em um aventureiro, em alguém que tenha coragem, pois a verdadeira religião é um fator vivificante e não anestésico. Tornar-se membro de uma igreja muitas vezes funciona, pois a sociedade irá pensar que somos pessoas religiosas. Não se pode esquecer que Jesus não foi assassinado por homens maus, por criminosos, mas sim respeitáveis rabinos. Na verdade foi morto, ou pelo menos conduzido à morte, por homens religiosos. Isso porque Jesus com sua verdadeira religião, com sua maneira autêntica de ser, questionava o poder formalista dos religiosos da época. Eram pessoas que não podiam aceitar os ensinamentos do Cristo, pois teriam que renunciar as tradições e caminhar para uma nova consciência, não para a criação de uma nova religião, mas para um caminho verdadeiramente religioso. Não importa qual religião seguimos, esta nunca será uma verdadeira religião se nos servir como um narcótico com preceitos formais e vazios, cantos emocionais e momentos de fuga da realidade, como um consolo para os sofrimentos da vida. "Mostre constantemente ossos de camelo a um homem e ele não poderá reconhecer um camelo vivo quando estiver diante de um" (provérbio árabe).