domingo, 6 de março de 2011

A CRISE, OS LOBBIES e o FUTURO



por

J. A. Horta da Silva
horta.silva@sapo.pt



Já ninguém nega a gravidade da situação económica e financeira a que Portugal chegou, muito embora a realidade tenha sido escondida para além do tempo tido por conveniente. Os políticos têm obrigação de falar verdade ao país, muito embora, em processos de extrema gravidade, se possa aceitar a existência de um período destinado à preparação da sociedade para a má notícia. Todavia, não é de excluir a hipótese de se ser governado por políticos que vivam na ignorância própria ou por força da incapacidade da máquina do Estado em fornecer, em tempo oportuno, os dados indispensáveis a uma análise correcta do ponto de situação.

De qualquer modo, não é possível esquecer as verdadeiras razões que conduziram António Guterres a pedir a demissão do cargo de Primeiro-Ministro, que se desculpou com os resultados das eleições autárquicas que lhe foram desfavoráveis, em vez de dizer de viva voz «o país está mergulhado num pântano e eu não sou capaz de o tirar de lá…» e, de igual modo, também não é possível esquecer as declarações de José Manuel Barroso que afirmou no início do seu mandato, «o país está de tanga» para aceitar, logo de imediato, o convite para presidir aos destinos da Comissão Europeia, convite igualmente formulado por Jacques Delors a António Guterres, que preferiu o desemprego, até ascender, por mérito próprio, ao cargo de Alto Comissário das Nações Unidas para os Refugiados.

Portugal caminha para eleições presidenciais numa altura delicada. Temos na Presidência da República um Prof. Universitário de Economia que sabe interpretar as informações detalhadas da área da sua especialidade e, muito provavelmente, da área financeira. O curriculum do PR inclui ainda vários mandatos como Primeiro-Ministro, singularidade que lhe dá uma capacidade acrescida. Se assim é, por que razão andaram os portugueses a ser enganados tanto tempo, no que se refere à dívida pública? Terá o Presidente da República, no âmbito do seu magistério de influência, acordado com o Primeiro-Ministro um compasso de espera para dar a conhecer a real situação do país ou, pelo contrário, terá forçado José Sócrates a ser mais célere nas suas declarações públicas? Não o sabemos e, muito provavelmente jamais o saberemos, a não ser que algum dos protagonistas decida abdicar do cargo para escrever as suas memórias.

Há dias, a Wikileaks agitou o mundo ao publicar um alforge de correspondência secreta que envolve personalidades de vários países, sem ter o cuidado prévio de separar o trigo do joio, enquanto o livro de Daniel Estulin, que já ultrapassou os dois milhões de exemplares vendidos, perpassa a verdade sobre os segredos de “O Clube Bilderberg” onde Henry Kissinger, Bill Clinton, Tony Blair, David Rockfeller, Paul Wolfowitz e muitos mais se propuseram decidir sobre o futuro de estados soberanos, facto que deu origem a crises políticas, económicas, financeiras e outras vividas em vários cantos do mundo. A razão das crises tem sempre uma componente endógena mas, muitas vezes, são induzidas do exterior. Os casos da Grécia, da Irlanda, de Portugal e da Espanha têm indiscutivelmente a mãozinha de Angela Merkel e de Nicolas Sarkozy. É o preço que estamos a pagar, face à queda de importância dos verdadeiros partidos democratas cristãos europeus que, conjuntamente com os sociais-democratas e socialistas, procuraram dar à Europa uma modelo social digno desse nome. Pelos vistos, já perdemos a batalha. Resta saber se o ataque especulativo da bolsa aos países mais frágeis da União Europeia não é o princípio de uma guerra aberta ao euro, coisa que se afigura, caricatamente, à margem das preocupações da chanceler alemã e do presidente francês.

Perante a confusão instalada, parece lógico perguntar: será que a entrada do FMI não clarificaria a situação de uma forma independente? A dúvida persiste instalada no cidadão comum. Face ao gigantesco universo do tráfego de influências, perdura, entre as populações, um traço de angústia acerca da isenção não só de gentes que detêm poder, mas também de imensas instituições.