segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

MUDANÇA DO LOCAL DO NASCIMENTO

Vladimir Souza Carvalho *


Primeiro, foi no livro Footballmania (uma história social do futebol no Rio de janeiro, 1902-1938), de Leonardo Affonso de Miranda Pereira.Lá estava, metida no texto, uma citação, entre tantas, de Gilberto Amado, acompanhada da assertiva de se cuidar de literato pernambucano (p.160). Meus brios de sergipano subiram. Estância, que lhe serviu de berço natal, perdia um filho, dos mais ilustres, para Pernambuco.

Passou. Não alterei meus hábitos, nem precisei desafiar o autor para um duelo.

Depois, foi num artigo de Márcio Contrim, aqui reproduzido, já faz algum bom tempo. Lá estava outra aleivosia: Gumercindo Bessa era tratado como alagoano. Bufei de raiva. Também nascido em Estância - parecia uma praga a recair em estancianos -, Gumercindo, que é nome de fórum em Aracaju, como Gilberto Amado, bom ressaltar, também é, deixava de ser sergipano para ganhar a condição de alagoano. Depois de morto, perdia sua condição de natural das terras de Sergipe.

Também passou. Fiquei calado. Pois então.

Na última sessão do Pleno, do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, em dezembro do ano findo, ouvi uma ilustre advogada fazer sustentação em defesa da procedência de uma revisão criminal. Sustentação concatenada, intercalada de citações. Para minha surpresa, uma, de Carvalho Neto, nascido em Simão Dias, sergipano, portanto, como eu. Mas, para a ilustre procuradora, Carvalho Neto era... alagoano.

Me danei. Não podia interromper a sustentação, para não violar nenhuma norma do regimento interno. Aguardei a minha vez de votar. E, ao votar, enfim, joguei o fato - que não conseguia engolir - para fora. Relembrei os dois casos anteriores, e corrigi: Carvalho Neto, aliás, Manoel Antonio de Carvalho Neto, político, jurista, escritor, advogado dos mais ilustres, primeiro ocupante da cadeira da Academia Sergipana de Letras, que ora me tem como titular, não era alagoano.

Protestei, então, e até abri espaço para colocar alguns nomes - que não citei - à disposição de outros estados, se algum interesse despontar, nomes, aliás, que não nos farão falta, e até deixarão um bom espaço. Mas, daquele trio, não, absolutamente não, eram sergipanos e continuarão sergipanos, para o além da eternidade. Manifestei receio que nos tirasse Tobias Barreto e Silvio Romero de Sergipe, o que seria caso de fechar as portas e apagar as luzes.

De qualquer forma, entre o sério e a cara feia (de brincadeira), fica a certeza de que, em local de nascimento não se mexe, nem se altera, porque determinados nomes, como os três aqui citados, ganham a auréola de ícones e deuses, não sendo de boa política, então, terem o local de nascimento transferido para outro estado, ainda que seja para Pernambuco e Alagoas.

* vladimirsc@trf5.jus.br
Publicado no Diário de Pernambuco