Vladimir Souza Carvalho *
Estou no pátio que antecede a saída do castelo, em Fussen, na Áustria, construído por D. Luiz II (Von Ludwig II, Konic von Bayern), monarca alemão que terminou declarado insano. O castelo, que a guia espanhola chama de castillo (e aí me vem à mente a figura do goleiro Castilho, do Fluminense), fica em parte bem alta, erguido no meio de uma plataforma de pedra. Contudo, o interessante da visita não é o castelo em si, mas o fato de, na saída, esperando as demais pessoas da excursão, ser chamado, por duas vezes, por algum brasileiro presente, de Santinha.
Só ai fui perceber que a expressão me era dirigida, por estar trajando a camisa do Santa Cruz, a mais nova, bem colorida e bonita. Deduzo, pelo tom grave usado e na conotação dada a expressão Santinha, que a pessoa não era torcedor do Santa Cruz. Deve ser do Sport ou do Náutico. Além de Santinha, a pessoa não me dirigiu mais a palavra.
Depois, na manhã de um sábado, em Guimarães, percorrendo o centro histórico urbano, no Largo de São Francisco, trajando outra camisa do Santa Cruz, escuto alguém, que vai entrar em um veículo, gritando o nome do Santa Cruz, numa expressão, desta vez, risonha. Sem dúvida alguma, embora não tivesse travado nenhum diálogo, só posso presumir se cuidar de torcedor do Santa Cruz, pela alegria que o rosto denunciava de ver a camisa do seu time em terras situadas do outro lado do Atlântico.
Foi só.
A experiência com a camisa do Sport, por outro lado, vivo em Veneza, numa quarta-feira de calor para ninguém do Piauí botar defeito. Na fábrica de cristais Murano, no momento em que todos da excursão estão na loja de vendas, alguém se aproxima de mim e me pergunta que time era aquele. Minha resposta é telegráfica: Sport... Recife... Pernambuco... Brasil. Nova pergunta me é lançada: da primeira (divisão)? Bem, já foi, respondo, meio sem graça. No momento, está na segunda divisão.
Depois, no ponto de embarque das gôndolas, outro italiano presta atenção a camisa,me dirigindo a indagação, no sentido de saber que time era aquele. Respondo da mesma forma anterior, e o torcedor liga o Sport a Juninho Pernambucano. Sim, sim, confirmo, nos entendemos bem, porque, afinal, o futebol é universal. A camisa referida, esclareço, é a que foi lançada para o primeiro jogo da Taça Libertadores da América. A outra, no seu vermelho e preto, embora mais reluzente, dias depois, em outras paragens europeias, passou completamente despercebida.
Já a do Náutico não atraiu nenhuma pergunta, no percurso Florença-Roma e no passeio (me recuso sempre a usar o termo tour, que, afinal, terminei grifando) por Roma barroca, a exceção do conselho dado por dois pernambucanos, que faziam parte do grupo, para colocar a camisa por fora a fim de evitar a ação de algum carteirista.
É a experiência que passei, na Europa, com a camisa do Santa Cruz, do Sport e do Náutico, abrindo um espaço para acrescentar que, em Lisboa, a do Itabaiana, levou um cidadão português a me perguntar acerca do estado em que taltime se localizava. Sergipe, no Nordeste, respondi. E aí me revelou ter morado alguns anos em São Paulo, desejando-me, por fim, boa permanência em Lisboa.
Outras camisas, como as do ABC e América (de Natal), Ceará e Fortaleza, não mereceram nenhuma pergunta. Nada mais a acrescentar. Só a minha palavra de que tudo é verdadeiro, do que dou a mais imensa fé.
* vladimirsc@trf5.jus.br
Publicado no Diario de Pernambuco