D.Edvaldo G. Amaral
(dedvaldo@salesianosrec.org.br)
Contrariamente ao que afirma Zuenir Ventura em seu famoso livro “1968 – o ano que não terminou”, denso de preciosas informações sobre a história recente de nosso país e sobre o estado de ânimo e as posições daquela juventude dos anos 1960, eu queria afirmar neste artigo que, ao contrário, o ano 1968 terminou sim. E pretendo explicar por que.
Comecemos pelos protagonistas. Os jovens, de seus 18 anos naquele ano, hoje estão com 60. É a turma de Daniel Cohn-Bendit, que liderou o movimento de contestação no “maio quente” da Sorbonne de Paris. Nascido em Montauban, na França, a 4 de abril de 1945, era filho de judeus alemães e optou pela cidadania alemã, porque, dizia, não queria se sujeitar ao serviço militar francês, que tinha como seu ícone principal o General Charles De Gaulle, herói da Segunda Guerra mundial e chefe do governo. Cohn-Bendit, apelidado na época de “Dany, o vermelho”, que tingia o cabelo e criou o slogan “somos todos judeus alemães”, hoje é um pacato político alemão, deputado no Parlamento europeu pelo Partido Verde.
E no Brasil, que é feito dos jovens ativistas políticos daquele ano? Bem, ou são capitães da indústria, abastados fazendeiros ou usineiros, ou estão é na política, no Congresso Nacional ou até no Palácio do Planalto. Serão muito provavelmente pacatos pais de família, com preocupações familiares e talvez até problemas financeiros.
É interessante recordarmos alguns de seus slogans preferidos, que eram seus gritos de guerra nas frequentes assembléias e passeatas, as duas atividades preferidas dos jovens estudantes da época como diz, com certa ironia, Zuenir Ventura em seu livro. Eram eles: “É proibido proibir” – “Não confie em quem tem mais de 30 anos” – “Trabalhador, tu tens 25 anos, mas teu sindicato é do século passado” - “Não faça guerra, faça amor” – “Todo poder abusa, o poder absoluto abusa absolutamente” – “O poder tinha as universidades, os estudantes tomaram-nas; o poder tinha as fábricas, os operários tomaram-nas; o poder tem o poder, tomem-no!”
Esses slogans soam hoje para nós como simples frases de efeito publicitário, sem maior significado. Diz Zuenir: “No meio de uma grande complexidade cultural, é que surgia uma geração de jovens intelectualizados, reagindo contra o tradicionalismo sexual e criando antitabus.” “A categoria ‘jovem’ virou marketing para tudo – de refrigerantes a idéias”, diz ele ainda.
Sem dúvida, o movimento mundial estudantil de 1968 produziu uma aceleração da história. No Brasil, porém, só tivemos eleições indiretas em 1985 com Tancredo Neves, que nem chegou a assumir a Presidência. Só em 1989, com a vitória do hoje senador Fernando Collor de Mello, com mais de 35 milhões de votos, no segundo turno, nas primeiras eleições diretas para a Presidência da República desde 1964, ficou consolidada a democracia brasileira. Collor, nascido em 1949, tinha 19 anos justamente no famoso 1968 e assumiu a Presidência aos 40, como o mais jovem Presidente da história brasileira e das Américas.
“O Brasil mudou muito ao longo desses anos, até mais do que os brasileiros percebem”, diz o economista Ricardo Amorim da revista ISTOÉ.
O ano 1968 terminou sim.
(*) É arcebispo emérito de Maceió.