Quando as “Palavras” e o “Direito” já não (re)presentam a realidade.
Uziel Santana dos Santos *
“E conhecereis a Verdade (Alethéia) e a Verdade vos libertará (...) A Palavra (Logos) é a Verdade (Alethéia] – Jesus Cristo, no ano 28.”
A partir do século passado, com a derrocada do soberbo projeto da modernidade da humanidade, estabelecido no “século das luzes” que desvanecem (o século XVIII), e, por certo, transliterado na máxima conteudística de que “o homem é a medida de todas as coisas” e a Razão é a plena expressão da divindade em nós, e, por assim ser, com o surgimento da chamada pós-modernidade da humanidade – a época áurea dos relativismos, onde não há mais o Caminho, a Verdade e a Vida, mas “caminhos”, “verdades” e “vidas” –, passamos a viver em um momento da história da humanidade onde as Palavras que dizemos e o Direito sob o qual vivemos, definitivamente, já não (re)presentam a realidade na qual existimos. Vivemos, desgraçada e alienadamente, a operação do erro e da mentira em seu máximo nível semântico, num estado de hipnose mental legitimado e legalizado, sob a égide de uma ordem individual e social na qual não nos reconhecemos mais.
Um típico exemplo desse estado de coisas descrito acima é o caso do chamado “Matrimônio” Homossexual. Ao fazermos uma simples análise etimológica dessa expressão, vemos o quanto estamos imersos em uma ordem onde as nossas Palavras já não representam a realidade concretamente. É como se, ao falarmos, mesmo a realidade dizendo-nos outra coisa (e, por assim ser, afirmando-nos a impossibilidade do que dizemos), mentimos descaradamente para nós mesmos e uns para os outros. Neste caso, por exemplo, a palavra “matrimônio” vem do latim “matrimónium” e, em linhas gerais, na sociedade e no Direito Romano, significava a união de homem e mulher com vistas a formar um consortium omnis vitae (consórcio para a vida toda). Assim, “Matri” vem de “Mater” (mãe) que, adicionado ao sufixo “monium”, representaria a faculdade jurídica que a mulher tinha para poder ser, natural e legalmente, “mãe”, contraindo núpcias com um homem (A. ERNOUT et A. MEILLET, Dictionnaire Étymologique, 1951). Se formos ao grego clássico, a não representação da realidade factual da expressão “Matrimônio” Homossexual é ainda mais alarmante, porque a palavra que dá origem ao termo matrimônio, no grego, é o substantivo Gamós, que procede de Gameo, palavra derivada da raiz gam- ou gem-, cujo significado é “encaixar juntos”, “formar um par”, ou mesmo, “gerar”, “dar à luz” (gennao)[CHANTRAINE, Pierre, Dictionnaire Étymologique, 1968]. Daí surgiram os termos biológicos “gametas” que são as células sexuais que representam a natureza dos sexos masculino e feminino e que dão este potencial genético que um “matrimônio” homossexual, de fato, em realidade e em verdade, não tem.
Tanto os gregos, quanto os romanos tinham um especial apreço em usar as Palavras de modo que representassem “realmente” a realidade. Neste sentido, eles usavam Palavras e escreviam Textos – científicos, literários e etc. – como “Mímesis” (imitação) da realidade (AUERBACH, E., Mímesis, 1942) e não como se faz, notadamente, agora, nesta era da pós-modernidade, quando usamos, muitas vezes falsamente, palavras e discursos para produzir realidades (Poíesis) ou mesmo descontruir realidades, como é o caso da expressão “Matrimônio” homossexual. Ora, de fato, há uma impossibilidade natural e real em se falar esta expressão, porque, simplesmente, a adjetivação “homo”, semanticamente, indica que se trata de um mesmo sexo, de modo que assim não há “gamos”, nem “matrimónium”, como explicamos acima.
Mas, porque estou a dizer tudo isso? Porque mais do que mentir sobre a realidade, esta expressão e luta política do movimento gay no mundo todo – como, agora, discute-se, vexatoriamente, na Argentina – faz parte de uma nonsense que é ainda mais aviltante no contexto em que vivemos: estou a falar, agora, do fenômeno jurídico como não representativo da realidade, é dizer, a não legitimação social do que se quer estabelecer e impor para todos. Isso porque a sociedade brasileira é eminentemente cristã (cerca de 95% da população). E, assim, em tese, este conjunto de pessoas entende o matrimônio como um sacramento entre homem e mulher, nos exatos termos da tradição etimológica grego-romanista que vimos e, mais ainda, nos exatos termos da tradição da moral cristã. Assim, estabelecer no nosso sistema jurídico que Matrimônio é um instituto (conceito), ou uma instituição (realidade), também entre pessoas do mesmo sexo é criar um “Direito” que não corresponde à nossa realidade, seja ela em termos de natureza humana, seja ela em termos de consciência e moral jurídica.
Destarte, a Palavra e o Direito devem ser, necessariamente, expressões semânticas fielmente representativas da nossa realidade natural, individual e social, tal como o Logos (Jesus), sempre foi, é e será a expressão exata da Alethéia de Deus.
* Uziel Santana dos Santos
[Professor da UFS, Advogado, Mestre em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco e Doutorando em Direito pela Universidad de Buenos Aires]
e-mail: ussant@ufs.br
Artigo publicado no Jornal Correio de Sergipe em 06 de junho de 2010.