segunda-feira, 31 de maio de 2010

ONDE MORA A ESPERANÇA?

Euza Noronha


Sempre ressuscito na segunda-feira. Porque a noite de domingo invariavelmente me mata um pouco. Esta segunda me acordou com uma dúvida cruel: corto ou não corto os cabelos? Gosto dos cabelos da Fafi Siqueira e eles combinariam com meus óculos quase vermelhos. Mas gosto também das madeixas rebeldes e encaracoladas que me dão ares remotos da década de 70. E que combinam com quaisquer óculos!

Uma vozinha interior, aquela chata de sempre, me lembrou que as horas passam por mim. Deixei a difícil decisão para depois e me sentei para o café da manhã. Automaticamente uma mão pegou o leite e a outra os jornais. Ler jornais antes de começar o dia é um masoquismo que conservo há anos. E para variar, caíram sobre mim todas as notícias que eu até posso precisar saber, mas bem que poderia ser depois do almoço.

Imediatamente a postura mudou. Política, guerra, crimes – me lembrei desta coluna. Segunda é o dia de escrever algo que preste. E a pergunta da Ray bailou frente aos meus olhos: este mundo tem jeito? Fiz a pergunta em voz alta e recebi um olhar de espanto do marido. Gostei e resolvi repeti-la. Agora, diretamente para ele. Quem sabe uma discussão à mesa do café não me inspiraria?

Com olhar de quem-está-perdendo-a-hora ele se levantou: não venho almoçar. Um beijo e lá se foi ignorando completamente minha necessidade de inspiração. Mas levo a sério o que me proponho e passei a pensar em como escrever sobre o jeito do mundo. Lembrei-me que há alguns anos a ONU fez um pacto com vários países, inclusive o Brasil, para que todos se comprometessem com a promoção da cidadania. Mas o que aconteceu de lá para cá? Pergunta boba, me respondi. O que existe é um expressivo retrocesso na qualidade de vida, sobretudo nos países em desenvolvimento, e uma brutal soberania dos fabricantes de guerra.

Parei por aí e fui me vestir. Mas o tema é instigante demais para ser posto de lado assim, assim. Enquanto me vestia, daquele jeito confuso de escolher várias roupas, fatos e fotos viraram um filminho na minha cabeça. E o que sempre sobressai quando penso nas dores do mundo são as crianças. Crianças morrendo na guerra, crianças morrendo de fome na África e as nossas crianças comendo lixo, cheirando tíner, já na universidade do crime. As crianças, estas que são o nosso futuro.
Mas nesta linha de raciocínio seria quase impossível descobrir um jeito para o mundo. Dei no cérebro um giro de 180 graus e concluí que mais interessante seria escrever sobre esperança. Não é fácil ter esperanças, mas é necessário. Eu, especialmente, não consigo viver sem acreditar que amanhã ou depois as coisas podem mudar. E a chata da vozinha voltou a me lembrar: esperança sem ação, morre na contramão! Não se espante, leitor. Esta rima é ridícula, mas inventei esta frase para usar comigo mesma, com meus filhos e meus alunos. É que realmente acredito nisso. Para mim, esperança necessita de investimento pessoal. É preciso engajamento, idealismo, é preciso abraçar uma causa e lutar por ela. Mudanças não acontecem por acaso ou por milagre. E fiquei por aí, porque havia uma entrevista de emprego me esperando.