segunda-feira, 12 de dezembro de 2011

HISTÓRIA DE DOIS ALICATES, ALGUNS VINHOS E MEL, MUITO MEL.

Betto Santos*


A principio caminhava apressadamente, então vi que o perigo era verdadeiro, acelerei ainda mais o passo. Carregava comigo diversas sacolas, tinha passado no supermercado e comprado mantimentos para a festa que daria na noite. Notei quando sai do supermercado que ele estava me observando. Sou atlético, no sentido “maratonista”. Meus braços são fracos, portanto não me envolvo em brigas. Quando saí e ele veio atrás, pensei que talvez estivesse enganado e ele não quisesse nada comigo. Agora eu começava uma leve corrida, não tive coragem de olhar para trás. Quando jovem ganhei uma maratona, duas horas e cinquenta minutos correndo, velocidade padrão, sem oscilar. Arrisquei olhar pra trás, e não foi surpresa ver que o homem estava a uns quinze metros de mim, acelerando o passo. Nas três sacolas tinha, respectivamente, uma corda e dois alicates, um rolo de papel higienico e alguns vinhos, e na última: Mel, muito mel. Comprei para fins particulares, não vem ao caso agora.

O homem acelerou ainda mais o passo e se aproximava. Sem devaneios joguei a sacola com um rolo de papel higienico e alguns vinhos no chão para ficar mais leve, acelerei. O homem agora gritava alguma coisa, não entendi nada, pois trespassava o vento com o rosto, e além desse barulho, só ouvia meus passos. Não pensei em tentar entender o homem, estava preocupado demais com minha fuga. Nunca tinha feito nada pra ninguém; entretanto, teve aquela vez... Mas não! Não era motivo pra alguém me matar. Morte, pensar nisso me assustou, me fez suar. Não costumo suar durante minhas corridas, sou atlético, preparado fisicamente. Não para fugas desesparadas, mas preparado. Arrisquei olhar para trás novamente. Um homem alto, forte por sinal. Usava algum tipo de uniforme. Talvez eles tenham algum tipo de organização assassina, pensei eu. Acelerei o máximo na minha corrida, larguei outra sacola, a da corda e dos alicates. Mas não larguei em direção ao chão. Joguei para o alto, quando a sacola caiu, acertou o homem na cume da cabeça. Sagaz da minha parte, apesar de ter sido sem pensar. Ganhei mais alguns metros e o homem alguns galos.

Tinha mais uma sacola, não podia largar. Foi quando o homem se irritou e começou a atirar. Atirar pedras, pois não tinha uma arma, ou não queria usar. Quando acordei, ainda sentia a dor e o sangue do tijolo que me acertara no crânio. Abri os olhos e ele estava ajoelhado sobre mim com um sorriso nos lábios. Disse então palavras que nunca esquecerei.

-Trabalho no supermercado, aqui está seu troco.

Tinha virado uma questão de honra pra ele, entregar-me o troco que eu havia esquecido. Para mim a questão era fugir. Não tenho culpa de ser assustado. Acordei dois minutos depois, ainda sentindo o soco que o homem me dera. Sim, ele trabalhava no supermercado e só queria me entregar o troco, mas eu tinha acertado uma sacola com dois alicates e uma corda na cabeça dele. No minimo, é uma justificativa pra eu desmaiar duas vezes. Enfim, tinha perdido duas sacolas e estava ferido, mas ainda tinha o mel. Muito mel.